A viagem

Depois de dois anos, estou voltando à minha terra natal: Belém do Pará. Ansiedade, alívio, tristeza e saudades - são os sentimentos que perpassam meu coração. Nestas férias, irei resolver um problema referente a documentos - verei primos e amigos - eram os objetivos ao fazer a viagem mais monótona da minha vida.

O Almirante corta as escuras águas da Amazônia. A paisagem é pintada pela densa vegetação e céu azulado com nódoas brancas - parecia algodão pregado na parede tingida de anil. Ao meu lado dormem o simpático casal britânico; que há 11 meses viaja por toda a América Latina, próximo das redes deles estão alguns peruanos que moram na Guiana Francesa. Durante a tarde, fiquei ouvindo a conversa do grupo, um dos peruanos se esforçava para fazer amizade com Katie e Peter, falava sobre o Brasil - que me causou grande aborrecimento - pois, reduziu o Brasil em carnaval e cachaça.

Um garotinho de quatro anos equatoriano se apresentou como “tchatcho” e me acompanhou durante toda a viagem enfadonha, até chegarmos ao porto Palmeiraço. No navio havia outros equatorianos, que assim como a família do meu amiguinho, viajariam ainda por três dias de ônibus à São Paulo para trabalhar na confecção de roupas. De vez em quando vejo alguns casebres enfeitando as margens dos rios. Algumas vilas pincelando a paisagem natural. Me fez lembrar, que um dia fui ribeirinha também, pois já morei na beira deste rio lamacento. O garotinho equatoriano me deu uma folga!

A viagem parece tranqüila e embalados somos pelo movimento contínuo das águas. Quando avistei os prédios acenando para embarcação, não senti emoção alguma - parecia que os dois anos longe de Belém não existiam, estava do mesmo jeitinho que deixei. “Tchatcho” se despediu de mim umas quatro vezes - com muitos abraços - dizia que iria para sua casa nova. Tão esperto, tão simples, tão equatoriano.

No dia seguinte, fui andar pelo bairro Marambaia e matei as saudades. Muitas lembranças. Peguei uma van para Castanhal com o intuito de resolver o tal problema dos documentos. Antes das 18h já estava em Marituba, na casa de grandes amigas - cheguei bem na hora de uma festa surpresa!

De volta para Macapá. Não consegui dormir, muito frio; sentia o sintoma da velha sinusite, talvez - eis minha saúde em frangalhos. O decrépito navio Coronel Júlio, corta suavemente a seda de águas barrentas e cintilantes sob o nascer do sol. Ao meu lado dorme Miki, uma japonesa que há 1 ano viaja pela América Latina. Creio que tenham outros turistas na embarcação - como o inglês que sempre está com a latinha de cerveja na mão. Insisti para que Miki falasse com ele, mas era tremendamente tímida.

Em Macapá, a acompanhei até o hotel América Novo Mundo. Fomos ao mercado central, onde Miki observou ser mais limpo que o Ver-o-peso, ela conheceu a Fortaleza de São José e a Casa do Artesão. Depois, nos despedimos sem a promessa de manter contato. Não me despedi do casal britânico, mas peguei o e-mail deles. Talvez, nunca mais os veja, mas foi um prazer conhecê-los.

No porto de Santana, em embarque e desembarque, vi pessoas de Londres, Bélgica, França, Equador, Guiana Francesa, Japão e Peru, mas o que faltou foram agentes da Vigilância Sanitária. Devido ao encarecimento das passagens aéreas (R$ 600,00 a R$ 800,00) nas férias, muitos procuram viajar de navio. Inclusive eu, que ganhei as passagens como cortesia, juntamente com uma suposta “gripe comum”.


*Texto escrito em tempo de pandemia em 2009. 

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