Gabriela, quem é ela?

Com pés descalços, pele marcada pelo sol. Anda pelas ruas do bairro do Zerão, Gabriela. Não é a personagem da literatura brasileira de Jorge Amado. Têm 11 anos, ainda é uma criança, mas tem um ofício, pedir. Às 6h30 da manhã, já bate à porta da vizinha – que alcunhou de "irmã" – sempre com a mesma frase: "Irmã dá pra senhora me arrumar um pouco de comida ou R$ 1,00 pra comprar mortadela?". Tem dia que passa mais de uma vez pra pedir, nem que seja água, às vezes acompanhada de primas bem menores, como Estéfane de 2 anos. Perde-se a conta de quantos bebês tem na sua humilde casa.
A menina respeita os adultos, é curiosa e entendida das coisas. Ao encontrá-la, não mais vai vê-la só de calcinha e descalça, porque a irmã explicou que ela deve vestir roupa e usar sandálias. Agora ela anda vestida, mas os pés nem sempre estão calçados.  Outra vez, Gabriela andou pela rua às 15h, numa tarde muito ensolarada, segurando pelo cós um calção vermelho imenso que vestia, contou que era do seu tio e o usou porque sua roupa estava toda molhada.
Ocasionalmente ela some, passa dias sem dar o ar de sua graça. Isso mesmo, Gabriela tem a graça de uma criança, principalmente quando a menina atravessa a rua puxando por uma corda seu brinquedo – um cachorro de plástico rosa e sujo sobre duas rodas. O que Gabriela tem de peculiar é o seu olhar, carregado por uma expressão adulta. Sua infância foi roubada pela negligência de seus responsáveis. Quem responde por ela é a avó. Existe a história contada pela idosa de que a menina sai de casa sem permissão: "é uma criança danada, que dá muito trabalho. Eu não mando ir pedir na rua, ela é que foge de casa".
Mas por que Gabriela foge? É a falta de comida? Gosto pelas ruas? Violência física, verbal ou psicológica que sofre no lugar onde deveria ser seguro? Quando indagada sobre fugir de casa e pedir na rua, ela sorrir e depois baixa a cabeça. Porém, se tentar olhar nos olhos dela, nota-se que a menina de pés descalços já viu muita coisa, não se sabe o que exatamente. Então, surge a pergunta: "Gabriela, quem é ela?".

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