Novembro 20

 Após o dia dos finados, na madrugada de terça-feira, acordei com o estrondo. Perguntei para o meu irmão se ele também tinha ouvido. Os barulhos continuaram. Até que senti o chão tremer. O céu era rasgado como um véu sobre o nosso teto. Então, veio o apagão.

     A operadora que minha irmã usa não ficou sem sinal, então, ela buscou saber sobre o ocorrido na internet. Hugo Gloss foi o primeiro a divulgar sobre o estado do Amapá para todo o Brasil com a notícia dos transformadores queimados. No início, pensávamos que o incidente tivesse sido causado por um raio, mais tarde desconfiamos que o governo tivesse se isentado de alguma responsabilidade, para depois descobrir que o caso era mais complexo e estava nas mãos do governo federal.  

     O calor e os mosquitos eram insuportáveis. Tivemos alimentos desperdiçados. Geladeiras danificadas. Casas incendiadas. Bairros ficaram sem água encanada. Sentíamo-nos estressados pela privação de sono e muitos outros transtornos que você não encontraria no Google. O Amapá ficou em estado de calamidade pública. Correu o risco de viver uma crise alimentícia. Todavia, a mídia nacional não deu importância, afinal não era São Paulo sem luz.

     Os que tinham boas condições financeiras correram para os hotéis da cidade ou viajaram para outros estados. Muitos apelaram ao shopping, aeroporto e até hospital com o intuito de recarregar seus celulares, se refrescar e até dormir. O povo sofreu, e ainda existia a pandemia.

    Após alguns dias sem eletricidade, um racionamento todo picotado fora iniciado. No entanto, nosso gasto emocional excedeu a conta. Durante este caos as pessoas recorreram ao rio Amazonas para se refrescar, outros foram às ruas para protestar. Vivemos momentos agoniantes por não termos o básico, muito menos por não sermos respeitados. Para piorar nossa sobrevivência neste fatídico mês, artigos como uma simples vela começaram a faltar nas prateleiras, assim como a integridade dos comerciantes que tiraram proveito da situação crítica para elevar os preços das suas mercadorias.

    Nas redes sociais, memes sobre a sorte do Amapaense eram compartilhados. E um pandemônio era narrado por políticos oportunistas, pois era uma grande promoção numa época confusa e de eleição. Nesta ocasião, cheguei a me questionar se havia tomado a decisão certa. Desejei muito retornar para Alter do Chão, mas queria aproveitar o restante do ano com meu sobrinho e irmãos.  

    No dia 24 tudo normalizou. Até a visita do ministro de minas e energia, mais do presidente, a imprensa amapaense noticiou. A população exaurida não quis recebê-los, porém, eram eles os responsáveis para resolver a difícil questão. Após o fim do racionamento, ficou a pergunta: “Poderíamos montar a árvore de natal ou nos preparar para mais um nível de desgraças?”.  

 

    Então, dezembro chegou com duas faturas da companhia de eletricidade. Por que duas? Pois é, foi uma irritante falha no sistema. Eram cobranças feitas pelo consumo de energia que nem usamos no mês anterior. Pelo visto, pagar a conta foi a única coisa que o apagão não apagou.

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