Quando ela partiu


O dia da partida dela estava próximo, e eu sentia um aperto no peito. O esforço para não demonstrar minha ansiedade era do tamanho do medo de ficar só, ou seja, era um oceano.

Uma hora ou outra, eu fazia perguntas a respeito de algum detalhe da viagem, coisas bobas. Dava pra perceber que ela não estava segura em nos deixar. Desde que nossa mãe morreu, ela tomou pra si a responsabilidade de se preocupar com o nosso bem estar, pensando bem, com a nossa existência!

Na verdade, como nossa irmã mais velha ela esteve conosco sempre, nos carregou no colo e nos alimentou. Na sua companhia, fiz passeios à tarde, assisti desenhos dos anos 1990, patinei com sacolas nos pés pelo assoalho de madeira da antiga casa e chorei no seu colo quando me achei feia.

Mesmo que depois da nossa grande perda ela tenha se vestido de força e dito “eu cuido de vocês”, era sofrido vê-la afundar mais uma vez naquele poço sem fundo. Os dois anos de dedicação eram suficientes para ver o quanto nos amava e se importava conosco. Doía pensar, mas ela precisava partir...

No dia da viagem, ela estava nervosa. Seria a segunda vez – desde 2005 – que nos deixaria por mais de 30 dias, sem data para voltar. E eu ficaria pela primeira vez sozinha para cuidar do meu filho, da casa e lidar com o meu irmão caçula. Sofri. Sobrevivi. Nem percebi, mas me disseram que amadureci e fiquei mais forte. Tudo isso aconteceu, quando ela partiu.


Comentários

Junior Caramell disse…
Mulher do norte. Mulher forte. Parabéns pela determinação, minha amiga.
E isso foi em Itaituba? Sou de lá :-)
Elle Custódio disse…
Então, a personagem não sou eu. A cena acontece em Macapá ou onde você quiser imaginar. Estava em Itaituba quando postei a crônica, cidade muito boa!

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